23.10.11

vejam só vocês, hoje eu descobri que tenho algo em comum com Guimarães Rosa: tanto eu como ele lemos Clarice Lispector "não para a literatura, mas para a vida".

"que desejava ser útil às pessoas, ao Brasil, à humanidade, e nem se encabulava de usar para si mesmo palavras tão imponentes".

mas o que aconteceu é que a cada dia que passa sou mais encabulada, mais inútil e mais arrogante. e cuspo isso em palavras como se estivesse descrevendo meus méritos.

nem um bom jantar parece fazer sentido. nem a música. nem os meus filmes preferidos. nem os móveis novos e a fotografia da audrey hepburn ou os gatos com nomes de personagens do Tarantino: tudo faz eu me sentir não eu. não me enxergo em nada (e em ninguém). isso é arrogância e eu não quero ser sim, mas aí acredito que todos são um pouco assim e o fato de eu não querer sê-lo só me torna ainda mais. me sinto naquele pesadelo dos ratos sem ninguém pra me acordar domingo de manhã. e aí tenho nojo de mim por não saber dar valor à vida e à terra e à natureza. e sinto nojo de mim por ter me perdido em algum lugar no meio do caminho entre o querer ser, o dever ser e o ser. nem o que eu escrevo é de verdade. não está no papel, não tem a tinta da caneta nem a falsa sensação de eternidade - o descaso é escancarado (a palavra que eu queria usar não é descaso, mas essa soou bem, e efemeridade não é um substantivo dramático o bastante).

achei que eu precisasse de um objetivo, mas de repente todos eles me parecem bobos. acho que a boba sou eu. pensei em ir morar na praia. o gato chegou.

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