29.11.09

O Amor e o Tempo

O tempo tudo cura, tudo faz esquecer, tudo gasta, tudo digere, tudo acaba. O tempo atinge até colunas de mármore, como poderia não atingir corações de cera?! Corações, esses, que são afeições como a vida, cujo mais certo sinal de que irão durar pouco, é já terem durado muito; são como linhas, que partem do centro para a circunferência, que quanto mais contínuas, menos unidas. Por isso os antigos sabiamente pintaram o amor menino: porque não há amor tão vigoroso que chegue a ser velho. De todos os instrumentos com os quais foi armado pela natureza, o tempo o desarma. O tempo afrouxa-lhe o arco, com o qual já não atira; cega-lhe as flechas, com as quais já não fere; abre-lhe os olhos, com os quais vê o que não via; e, por último, faz-lhe crescer asas, com as quais voa e foge. A razão natural de todas essas mudanças é porque o tempo tira a novidade das coisas, descobre os defeitos, cansa o gosto. Gasta-se o ferro com o uso, quanto mais o amor. E então, o mesmo amar é causa de já não amar; e ter amado muito, de amar menos.

de Pde. Antônio Vieira (adaptado por Luciana Brandão)

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