18.5.11

ele me deu um livro, joão. um livro! você acredita nisso? mas não foi um livro qualquer. não foi uma daquelas obras pseudo-intelectuais do caio fernando abreu e do hesse que o idiota do meu ex-namorado me intimava a ler. também não foi algo completamente aleatório, da estante dos mais lidos, que a gente dá pras pessoas quando elas estão de aniversário e não se tem a mínima ideia do que entregar embrulhado no papel de presente. ele me deu um livro sorridente, joão. quando passei meus dedos pela capa foi como se reencontrasse uma das minhas leituras favoritas de quando tinha treze anos e meus rosto carregasse um sorriso o tempo todo. foi como se, pela primeira vez, você não tivesse passado pela minha vida e todas aquelas cicatrizes e arranhões se diluíssem em um mar de letras, poesia e açúcar.
lembro que o único presente que você me deu foi um marcador de páginas. um marcador de páginas, joão! não obstante todos os cortes e machucados, tudo o que restou dos nossos três anos foi um pedaço débil de cartolina com a imagem de um anjo torto que me encara toda vez que eu abro meu livro de bolso do pessoa naquele poema até hoje inédito.
eu não o amo, joão. pelo menos não por enquanto. e a sensação que eu tenho é que nunca vou ser capaz de amá-lo por inteiro. é como se uma parte do meu coração tivesse entupido as veias e por ali não passasse mais sangue desde que você se foi e eu só sentisse o peso de um músculo morto debaixo do meio seio esquerdo. é que você, joão, você é pra sempre. você é aquele chiclete que fica com gosto e textura asquerosos de tanto ser mastigado, mas que a despeito de qualquer coisa é eterno. e ele não. ele é um doce açucarado, efêmero e gostoso como uma bala de caramelo, que vai se derreter entre meus lábios e minha língua em um piscar de olhos e então vai passar. ele vai passar, joão, e você vai ficar se decompondo no meu corpo por milhares de anos. eu vou ler todas as crônicas da clarice lispector e o livro dele vai ficar esquecido na minha estante ao lado do caio. enquanto você e seu marcador de páginas idiota vai ficar na minha mesinha de cabeceira. vai ficar, joão. pra sempre.

Um comentário:

Rodrigo Oliva Peroni disse...

Bah. Lindo.

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